Busão das Artes chega à capital fluminense com a exposição Lixúria, uma experiência imersiva sobre meio ambiente e futuro
Um museu sobre rodas que espelha a sociedade e se camufla no espaço urbano. Assim é a nova temporada do Busão das Artes, um caminhão-baú de 15 metros que se transforma em espaço expositivo e viaja o Brasil. Com curadoria e direção artística de Marcello Dantas, o projeto apresenta a exposição “Lixúria” — uma jornada sensorial que une arte e educação ambiental.
Com entrada gratuita, a mostra itinerante chega à capital fluminense e o Busão das Artes ficará estacionado na Praça da Harmonia, Gamboa, de 05 a 17 de novembro. Após, passará por outras cidades do estado: Niterói, São Gonçalo, Macaé, Cabo Frio, Resende e Paraty. O projeto oferece atividades abertas ao público em geral e uma programação especial para escolas públicas e privadas. Com patrocínio da Enel Rio e Sotreq, o Busão das Artes integra a programação cultural promovida pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro em comemoração a COP30, realizada no Brasil em 2025.
A exposição conta com obras dos artistas visuais Vik Muniz, Sueli Isaka, Guto Lacaz, Sandra Lapage, Pirilampos do Planeta, Tomazicabral, Jessica Mein, Karola Braga, Coopa Roca, Janaina Mello Landini, Adrianna Eu e Alexandre Farto aka Vhils.
A imersão começa com o próprio caminhão, que foi revestido com película espelhada que reflete o entorno, quase desaparecendo no espaço e tornando-se um espelho crítico da sociedade. Além disso, o espaço se divide em ambientes interno e externo, concebidos para provocar e surpreender o público, especialmente crianças e adolescentes, com experiências lúdicas e sensoriais.
“O lixo é um espelho do nosso comportamento. Quando olhamos para o que descartamos, enxergamos quem somos como sociedade. A ideia da exposição “Lixúria” é justamente tornar esse espelho visível e provocar reflexão sobre nossos hábitos de consumo e descarte. Cada pessoa gera, em média, até 28 toneladas de lixo ao longo da vida. É um dado brutal, mas que precisa ser encarado. Se até um bebê, nas primeiras semanas de vida, já produz uma quantidade considerável de resíduos, precisamos repensar coletivamente o destino de tudo o que descartamos. O lixo não desaparece. Ele se acumula, se transforma e, também, pode ser ferramenta de educação e cidadania. Queremos tirar o lixo “debaixo do tapete” e colocá-lo no centro do debate, da arte e da curiosidade. O que parece rejeito, na verdade, carrega histórias, potencial criativo e até beleza”, explica o curador Marcello Dantas.
Ao adentrar o Busão, o visitante se depara com a cenografia marcante de um patchwork de embalagens revestindo as paredes e o teto, construído a partir de lixo limpo como tampinhas, embalagens tetrapak, pacotes e plásticos diversos. Também, a obra Marat (Sebastião), da série Pictures of Garbage, de Vik Muniz, produzida a partir de seu projeto com os catadores do aterro sanitário Jardim Gramacho, da cidade do Rio de Janeiro, estará exposta.
Nesse espaço, o filme Ilha das Flores (1989), de Jorge Furtado, é exibido em looping, convidando o público a repensar desigualdade, consumo e destino do lixo. O visitante também encontra duas estações interativas: uma balança que calcula, em quilos, a quantidade de lixo que cada pessoa produzirá ao longo da vida (uma experiência que busca dar o peso concreto do impacto individual), e um mapa digital, via Google Earth, com informações sobre os lixões, aterros sanitários e pontos de coleta das cidades visitadas.
Do lado de fora, a experiência continua. Espalhadas ao redor do caminhão, latas de lixo galvanizado com tampas guardam surpresas que se revelam ao serem abertas pelos visitantes. Dentro delas, o público encontra obras de arte dos artistas Sueli Isaka, Guto Lacaz, Sandra Lapage, Pirilampos do Planeta (Lula Duffrayer e Flávio Carvalho), Tomazicabral, Nazareno, Jessica Mein, Karola Braga, Coopa Roca, Janaina Mello Landini e Adrianna Eu, compostas por objetos inventivos criados a partir de resíduos e personagens simbólicos como o “Bicho de Lixo”. Algumas das obras também acionam efeitos sonoros, visuais ou mecânicos.
No mesmo ambiente, a obra “Marca Temporária, Memória Coletiva”, do artista Alexandre Farto aka Vhils, propõe uma intervenção colaborativa com o público. Em cada parada, uma grande tela negra perfurada é posicionada sobre o chão claro, revelando, por contraste, uma imagem previamente desenhada. Essa superfície urbana servirá como suporte vivo da arte, construída a partir de materiais naturais encontrados no próprio local, como areia, pedras, ou ervas secas, recolhidos em parceria com a comunidade local. Esses materiais são aplicados sobre a tela para formar a imagem. O processo ativa o entorno, valoriza os recursos do lugar e estimula o engajamento coletivo na criação artística. Ao final, a tela é retirada, deixando no chão a marca efêmera da obra, que desaparece com o tempo, mas permanece na memória de quem participou.
A experiência traz práticas educativas coordenadas pela Percebe, uma consultoria especializada em educativos de museus e exposições, que promovem encontros significativos entre os públicos e as obras, por meio de visitas mediadas, oficinas e propostas interativas. O atendimento será voltado tanto para grupos escolares agendados quanto para o público espontâneo, com abordagens adaptadas a diferentes faixas etárias e perfis de interesse.
A exposição Lixúria dá continuidade a uma trajetória já consolidada de exposições itinerantes promovidas pelo Busão das Artes, sucedendo os projetos “A Casa que Anda – que mistérios tem Clarice?”, que levou ao público uma experiência sensorial inspirada na obra infantojuvenil da escritora Clarice Lispector, e “O mundo invisível”, concebido no contexto pós-pandêmico, que abordava de forma lúdica e educativa o universo dos fungos, vírus e bactérias. Trata-se de um projeto de educação gratuito, inclusivo e democrático, idealizado por Renata Lima, da Das Lima Produções, em parceria com a dupla Lilian Pieroni e Luciana Levacov, da Carioca DNA.
Ao longo do semestre, o Busão das Artes já passou por Rondônia (Porto Velho), Tocantins (Palmas) e Ceará (Fortaleza). A expectativa é que mais de 130 mil pessoas passem pelo Busão nessa temporada.
Sobre o curador Marcello Dantas
Marcello atua na fronteira entre a arte e a tecnologia, produzindo exposições, museus e múltiplos projetos que buscam proporcionar experiências de imersão por meio dos sentidos e da percepção. Nos últimos anos, esteve por trás da concepção de diversos museus, como o Museu da Língua Portuguesa e a Japan House, em São Paulo; Museu da Natureza, na Serra da Capivara, Piauí; Museu da Cidade de Manaus; Museu da Gente Sergipana, em Aracaju; Museu do Caribe e o Museu do Carnaval, em Barranquilla, Colômbia.
Realizou exposições individuais de alguns dos mais importantes e influentes nomes da arte contemporânea como Ai Weiwei, Anish Kapoor, Bill Viola, Christian Boltanski, Jenny Holzer, Laurie Anderson, Michelangelo Pistoletto, Studio Drift, Rebecca Horn e Tunga. Foi também diretor artístico do Pavilhão do Brasil na Expo Shanghai 2010, do Pavilhão do Brasil na Rio+20, da Estação Pelé, em Berlim, na Copa do Mundo de 2006. Foi curador da Bienal do Mercosul, realizada em 2022, em Porto Alegre, e é atualmente curador do SFER IK Museo em Tulum, no México.
