Cada demissão traz prejuízos ocultos, como perda de conhecimento e desgaste da equipe, mas poucos gestores jurídicos monitoram o impacto
A alta rotatividade de profissionais é um dos maiores desafios enfrentados pelos escritórios de advocacia no Brasil. Pesquisa realizada pela consultoria Bold HRO em 2024 apontou que 63% das bancas jurídicas registraram taxas de turnover entre 10% e 20% no último ano, um aumento de cinco pontos percentuais em relação a 2023. O dado reflete um problema estrutural, falhas na gestão de pessoas e na cultura organizacional, que geram custos financeiros e simbólicos ainda pouco mensurados no setor.
O impacto financeiro da rotatividade vai muito além do processo de desligamento. Estudos internacionais, como o levantamento da Society for Human Resource Management (SHRM), estimam que o custo médio da substituição de um colaborador pode chegar a três a quatro vezes o valor do seu salário anual, considerando recrutamento, treinamento e perda de produtividade. Aplicado à realidade de escritórios de médio porte, esse número significa prejuízos de centenas de milhares de reais por ano, especialmente em cargos de liderança ou posições com conhecimento técnico específico.
No Brasil, a alta rotatividade também é um reflexo da ausência de estrutura formal de Recursos Humanos nas bancas jurídicas. Pesquisa da AB2L (Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs) e da FGV Direito apontou que apenas 28% dos escritórios possuem área dedicada à gestão de pessoas, e a maioria das decisões relacionadas a contratações e desligamentos ainda é tomada exclusivamente pelos sócios. Essa informalidade compromete o planejamento estratégico e reforça o ciclo de instabilidade.
Segundo o especialista em negócios jurídicos Cristiano Ferreira, fundador do Grupo Advogado 10x, a origem do problema está na falta de visão empresarial dos escritórios. “Muitos gestores jurídicos ainda acreditam que basta contratar bons advogados para o negócio prosperar, mas ignoram que sem cultura, comunicação e estrutura de gestão de pessoas, o escritório se torna um ambiente tóxico e caro. A cada saída, perde-se não só o profissional, mas o conhecimento acumulado e a confiança da equipe”, afirma.
O custo oculto das demissões inclui também desgaste emocional dos times, perda de capital intelectual e ruptura de vínculos com clientes. A consultoria Perroni, especializada em gestão jurídica, estima que o tempo médio para um novo advogado atingir plena produtividade é de seis a nove meses, dependendo da complexidade do caso e da cultura interna. Durante esse período, o escritório opera abaixo de sua capacidade e os custos indiretos se acumulam.
Outro dado relevante é o da OAB Nacional, que identificou que 72% dos advogados autônomos e 54% dos que atuam em bancas privadas apontam o clima organizacional e a falta de reconhecimento como principais fatores de insatisfação na carreira. As causas mais recorrentes da rotatividade incluem sobrecarga de trabalho, falta de plano de carreira, pouca autonomia e desalinhamento de valores entre sócios e colaboradores — aspectos que se assemelham aos desafios enfrentados por empresas de outros setores.
Na avaliação de Ferreira, os escritórios de advocacia precisam abandonar o modelo puramente técnico e adotar práticas corporativas de gestão. “A advocacia é, antes de tudo, um negócio de pessoas. Escritórios que não tratam seus advogados como talentos a serem desenvolvidos acabam virando fábricas de burnout e alta rotatividade”, diz. Ele defende que a solução passa por um RH jurídico estruturado, com políticas claras de desenvolvimento, comunicação interna e acompanhamento de desempenho.
A retenção de talentos, segundo levantamento da Fenalaw Lab, é hoje o principal foco de 41% dos gestores jurídicos entrevistados em 2025. As ações mais eficazes envolvem programas de mentoria, flexibilização de horários, plano de progressão e cultura de reconhecimento. Quando essas práticas são incorporadas, a taxa de turnover pode cair até 40% em um ano, segundo o mesmo estudo.
Em um mercado que já soma mais de 1,3 milhão de advogados ativos, o maior contingente do mundo, a disputa por profissionais qualificados é intensa. O desafio dos escritórios, portanto, é conciliar produtividade e bem-estar, garantindo continuidade e confiança dentro das equipes. A rotatividade, mais do que um número, tornou-se um termômetro da saúde organizacional das bancas jurídicas e ignorá-la custa caro, em todos os sentidos.
Caminhos para reduzir a rotatividade nos escritórios
Diminuir a rotatividade exige uma mudança cultural dentro dos escritórios, que precisam encarar a gestão de pessoas como parte estratégica do negócio. O primeiro passo é construir planos de carreira estruturados, que ofereçam clareza sobre oportunidades de crescimento e critérios de promoção. A adoção de uma cultura de feedback contínuo e de comunicação aberta entre sócios e equipe também é essencial para evitar desalinhamentos e desmotivação. Programas de treinamento e mentoria ajudam a desenvolver habilidades técnicas e comportamentais, reforçando o vínculo entre líderes e colaboradores.
Outro ponto fundamental é promover políticas de bem-estar e equilíbrio entre vida pessoal e profissional, reduzindo o estresse e prevenindo o esgotamento mental, fatores que estão entre os principais motivos de saída no setor jurídico. Monitorar indicadores como engajamento, satisfação e tempo médio de permanência deve fazer parte da rotina de gestão, com a mesma importância dada aos resultados financeiros. Para o especialista Cristiano Ferreira, “reter talentos não é apenas pagar bons salários, mas criar um ambiente onde o profissional se sinta parte de algo maior. Quando o advogado percebe que cresce junto com o escritório, ele escolhe ficar”.
Sobre Cristiano Ferreira
Cristiano Ferreira é empreendedor jurídico e fundador do Grupo Advogado Adv10x, a maior comunidade de negócios entre advogados do Brasil, com mais de 30 mil profissionais conectados. À frente da organização, lidera iniciativas que integram educação, autoridade, networking, inovação e soluções práticas para a advocacia moderna, com atuação no Brasil e no exterior. É responsável pela construção de parcerias estratégicas, como a firmada com o BTG Pactual que hoje se posiciona como banco oficial da advocacia e a mentoring League Society, grupo liderado por Flávio Augusto.
Idealizador da primeira escola de negócios jurídicos do país inspirada no modelo da G4 Educação, Cristiano tem como missão transformar a carreira tradicional dos advogados em trajetórias de protagonismo e alta performance. Seu trabalho é voltado à preparação de profissionais para um mercado jurídico mais competitivo, tecnológico e orientado a resultados, combinando visão empresarial com formação técnica e inteligência de mercado.
