*Vaniele Silva Pinto Pailczuk
A maior dificuldade na saúde masculina não está na falta de tratamentos, mas na decisão de procurar ajuda. A maioria dos homens só busca atendimento quando a situação já é grave, como em casos de infarto, insuficiência renal, câncer em estágio avançado ou emergências decorrentes de acidentes. Consultas de rotina, exames simples e ações preventivas continuam sendo negligenciados por grande parte desse público, muitas vezes por desconhecimento, preconceito ou falta de tempo. Essa resistência tem custado caro, pois muitas vidas poderiam ser salvas com atitudes simples de autocuidado.
As doenças cardiovasculares são o maior exemplo do descuido silencioso, porque permanecem como a principal causa de morte entre homens no Brasil, com cerca de 400 mil óbitos anuais, segundo o Ministério da Saúde. Entre as doenças mais letais estão o infarto agudo do miocárdio, o acidente vascular cerebral, a insuficiência cardíaca e a hipertensão arterial, que frequentemente é assintomática e subdiagnosticada. O diabetes mellitus também merece destaque, já que aumenta de duas a quatro vezes o risco de infarto e está associado a complicações vasculares e metabólicas graves. Somam-se a esses fatores a obesidade e as dislipidemias, condições agravadas por alimentação inadequada, sedentarismo, tabagismo e estresse crônico.
A cultura da masculinidade tradicional é outro elemento decisivo nesse cenário. O ideal do homem forte e invulnerável ainda faz com que procurar um médico seja interpretado como sinal de fraqueza. Esse pensamento cria um ciclo perigoso, no qual o homem ignora sintomas e evita exames simples, como o toque retal, adiando o cuidado até que seja tarde demais. A prevenção, portanto, não pode se restringir ao Novembro Azul. Ela precisa ser incorporada à rotina, com acompanhamento clínico regular e atenção constante à saúde física e mental.
Entre os fatores relacionados à saúde do homem, também pesa a sobrecarga da vida cotidiana. Muitos homens se veem presos a longas jornadas de trabalho e responsabilidades familiares, o que os leva a negligenciar o próprio bem-estar. Em busca de alívio rápido, recorrem ao álcool e ao cigarro, práticas que oferecem conforto momentâneo, mas comprometem seriamente a saúde. Nesse contexto, surge uma pergunta essencial: por onde começar o cuidado preventivo?
O primeiro passo deve ser a consulta com o clínico geral ou médico de família. Esse profissional realiza uma avaliação global, solicita exames básicos como sangue, urina, colesterol, glicemia e função renal, revisa vacinas e orienta sobre hábitos saudáveis. Quando necessário, encaminha para especialistas, como cardiologista, endocrinologista, psiquiatra, psicólogo ou urologista. Este último não deve ser visto como porta de entrada, mas como parte complementar do cuidado, especialmente a partir dos 50 anos ou em casos de maior risco. Além das barreiras individuais, existem desafios estruturais. Apesar da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem, ainda faltam programas contínuos, campanhas educativas permanentes e maior acesso a consultas preventivas. Mudar esse cenário requer investimento, compromisso político e engajamento coletivo. Entre as medidas essenciais estão o check-up anual a partir dos 40 anos, o monitoramento da pressão arterial, glicemia, colesterol e peso. Além da alimentação equilibrada, prática regular de atividade física, abandono do tabagismo e do consumo excessivo de álcool. Bem como a atenção à saúde mental e a educação em saúde desde a adolescência.
O maior desafio da saúde masculina é a combinação de descaso, falta de informação e a cultura do silêncio. Romper esse ciclo exige mais do que campanhas pontuais: requer mudança de mentalidade, políticas públicas eficazes e serviços acolhedores. Vale ressaltar que, o cuidado não diminui a masculinidade e fortalece a vida. Coragem não é a ausência do medo, mas o ato de enfrentá-lo, realizar exames, quebrar preconceitos e mudar hábitos. A saúde do homem precisa sair do tabu e tornar-se prática diária. Tudo começa com um passo simples: marcar uma consulta.
*Vaniele Silva Pinto Pailczuk, enfermeira, especialista em UTI/ Urgência e Emergência, professora e tutora de cursos de pós-graduação na área da saúde no Centro Internacional Uninter.
