Educação - Desigualdade digital no Brasil expõe desafios comuns à América Latina

 Por Martín Morelli, consultor em transformação digital em instituições de ensino na América Latina

Martín Morelli

Enquanto escolas privadas avançam na adoção de tecnologias educacionais, milhões de estudantes brasileiros ainda enfrentam exclusão digital, um problema que ecoa em toda a região latino-americana.

No Brasil, a digitalização da educação se tornou símbolo de progresso, mas também um reflexo cruel das desigualdades sociais. Em escolas privadas de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, alunos têm acesso a plataformas de inteligência artificial, bibliotecas digitais e até realidade aumentada. Já em muitas regiões do Norte e do Nordeste, estudantes dividem celulares com familiares, e professores precisam improvisar aulas diante de conexões instáveis.

Esse contraste não é isolado. Em países como México, Peru e Argentina, a disparidade entre escolas públicas e privadas também se ampliou. Segundo a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), em 2021, cerca de 40% das crianças latino-americanas não tinham acesso estável à internet, número que no Brasil atingia sobretudo áreas rurais e comunidades periféricas.

A pandemia de COVID-19 escancarou um fenômeno que especialistas chamam de “nova exclusão”: não basta ter dispositivos; é preciso saber usá-los de forma crítica e pedagógica. Um tablet sem orientação pode se transformar apenas em entretenimento, não em ferramenta de aprendizagem. O resultado é um abismo ainda maior: alunos de famílias privilegiadas aprendem programação, análise de dados e literacia digital, enquanto colegas de baixa renda permanecem restritos a usos básicos da tecnologia.

Apesar dos desafios, há exemplos positivos. Programas de conectividade em estados como Ceará e São Paulo vêm ampliando o acesso à internet escolar. Parcerias público-privadas têm levado banda larga a regiões remotas e projetos de capacitação docente começam a mostrar impacto. No Chile e no Uruguai, políticas consistentes de inclusão digital escolar já inspiram governos vizinhos. Para especialistas, se o Brasil, pelo seu peso demográfico e econômico, avançar em políticas estruturadas, poderá se tornar referência para toda a América Latina.

A desigualdade digital é, acima de tudo, um problema de visão estratégica. A questão não é se a tecnologia vai transformar a educação, mas como e para quem. O Brasil carrega a responsabilidade de não apenas expandir cabos e distribuir dispositivos, mas de garantir que a revolução digital seja inclusiva. Caso contrário, corre-se o risco de perpetuar uma geração dividida entre os que estão dentro e os que estão fora do futuro.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem